Problemas da substituição tributária do ICMS

A partir de 2008, os estados brasileiros passaram a utilizar este instituto para uma enorme gama de produtos, provocando diversas contradições aos objetivos originais da proposta

A substituição tributária do ICMS, na forma como se encontra atualmente, introduz enorme complexidade ao sistema, dificulta a fiscalização e há várias evidências de que aumenta a evasão.

O instituto foi criado para situações especialíssimas, normalmente para produtos de grande relevância para a arrecadação desde que sejam homogêneos, tenham preços finais conhecidos e uniformes, possuam produção concentrada e as vendas finais sejam feitas por uma grande rede de pequenos varejistas capilarizados pelo território.

A partir do ano de 2008, os estados brasileiros, principalmente das regiões mais industrializadas do Sudeste e Sul, passaram a utilizar este instituto para uma enorme gama de produtos que nada têm a ver com as características acima, provocando diversos problemas e contradições dos quais destacamos:

  • A negação do próprio instituto na medida em que produtos diversos e heterogêneos que passaram para o regime são produzidos e distribuídos por milhares de fabricantes e distribuidores que, por sua vez, passaram à condição de contribuintes substitutos em escala altamente desconcentrada. Ora, o que fora criado para concentrar a arrecadação e a fiscalização em poucos grandes contribuintes virou o seu próprio contrário, passando-se para milhares de pequenos estabelecimentos, repondo a necessidade de serem fiscalizados;

  • O mesmo fenômeno se repete quando, na impossibilidade prática de se estabelecer acordos de substituição tributária para uma imensa gama de produtos heterogêneos entre as diversas unidades federadas, expandiu-se o instituto do pagamento antecipado na entrada das mercadorias nos estados, criando-se uma imensa malha com centenas de milhares de contribuintes responsáveis pelo pagamento do ICMS das operações posteriores – ou seja, milhares de pequenos contribuintes passaram a condição de substitutos, repondo-se, mais uma vez, a necessidade de serem fiscalizados (uma negação do próprio modelo de substituição tributária);

  • Aumento da taxa de evasão fiscal na medida em que novos esquemas elisivos e de sonegação passaram a surgir. O principal deles foi a criação de diversos atacadistas nas cadeias de distribuição que passaram à condição de substitutos na entrada das mercadorias no estado, boa parte destes é constituída por quadros societários de interpostas pessoas. São empresas que além de sonegar o imposto, caem em inadimplência da parte declarada, ensejando-se autos de infração e processos de cobrança ineficazes (viram dívida ativa de difícil ou impossível cobrança – não se acham os sócios);

  • Centros de distribuição e atacadistas foram abertos em áreas limítrofes de estados vizinhos com o objetivo único de receber mercadorias sujeitas à substituição tributária do estado de origem, ensejar bilionários saldos de ressarcimento do ICMS-ST ao remetente (hipótese do fato gerador presumido não realizado) e, ainda por cima, reintroduzir as mercadorias no estado de origem, mas desta vez espraiadas pela malha varejista. Neste caso, o estado perde duas vezes, ao promover o ressarcimento ao remetente (o que é perfeitamente legal) e ter de ir atrás da sonegação presente na imensa malha de varejistas que passam a condição de substitutos de si mesmos pelo pagamento antecipado;

  • Há diversos outros esquemas que foram criados após o advento da substituição tributária massificada com o intuito de se escapar do regime. Estes esquemas impuseram grandes dificuldades às fiscalizações estaduais e aumentaram a taxa de evasão fiscal, justamente o contrário do que o instituto se propõe a combater. Descrevemos acima os mais evidentes e comuns. Uma descrição completa deste descalabro demandaria laudas e laudas.

  • Para as empresas do Simples Nacional constitui uma enorme desvantagem em termos de custo de capital de giro (pois é vedado o crédito) e em custos de conformidade, uma vez que implica grande complexidade, situação que é pior para o pequeno empresário. Tanto é que um dos motivos da SAP não desenvolver programas fiscais para as empresas brasileiras é justamente a alta complexidade que os regimes de ST impõem aos contribuintes. Este grau de complexidade só existe no Brasil.

  • Além disto, a substituição tributária sujeita as empresas do Simples Nacional a pagamentos do ICMS por fora do DAS, aumentando o seu custo tributário, como o ICMS-ST, e o pagamento antecipado com encerramento na entrada da mercadoria advindas de operações interestaduais. Para o cálculo do DAS, as mercadorias sujeitas à ST devem ser consideradas à parte, acarretando maiores custos tributários e de conformidade às empresas do Simples Nacional, retirando-lhes o mandamento constitucional do tratamento preferencial e simplificado.

  • Para piorar a situação, no julgamento do RE 593.849/MG em outubro de 2016, o STF mudou o entendimento fixando a seguinte tese jurídica: É devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior a presumida. A partir desta decisão, mais complexidade recai sobre a substituição tributária, reforçando as suas contradições. Os interessados, diversos estabelecimentos varejistas que solicitarem a restituição, hão de demandar intensa fiscalização nesta imensa malha de pequenos contribuintes, justamente o contrário do que o instituto se propõe a fazer. Esta decisão gerou mais complexidades. Por exemplo, no estado de São Paulo há três portarias que regulamentam o ressarcimento e a restituição do ICMS-ST, cada qual validada para um período: 1999 a 2015, e 2015 a 2018. A sua aplicação depende da época da ocorrência do fato gerador. Se o empresário solicitar ressarcimento ou restituição de créditos do ICMS-ST, terá dificuldades operacionais, pois não há um leiaute padrão para que se faça um controle racional do imposto.